A Operação Lava-Jato é considerada uma referência internacional no combate à corrupção, com desdobramentos em todo o Brasil e no exterior. Seu nome, como se sabe, decorre do uso de uma rede de postos de combustíveis em Brasília para movimentar recursos ilícitos pertencentes a uma das organizações criminosas envolvidas, daí emergindo ramificações extremamente sofisticadas.
No âmbito de uma investigação desse porte, surgem informações que conduzem a ilícitos das mais diversas naturezas e distintas competências e atribuições. Para ações penais, fixou-se a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba (PR), onde atua o juiz Sérgio Moro, mas existem outras ações que, versando fatos correlatos, podem tramitar em juízos federais distintos no Maranhão, no Rio de Janeiro e em São Paulo, sem falar na competência das justiças estaduais.
É certo que o Ministério Público necessitará organizar uma atuação nacional, não apenas com intercâmbio de informações e articulação de estratégias, mas para fortalecer o princípio da unidade e a coesão de seus membros. Por exemplo, se os integrantes do MPF possuem atribuições específicas para atuar na investigação de um caso que, sob outro ângulo, também é investigado pelo MP/SP, é lógico que essas instituições devem dialogar.
Não é possível que membros de um ramo do MP atuem sem o conhecimento ou o aval de outro, atrapalhando-se mutuamente, ou prejudicando estratégias de médio ou longo prazos. Coordenar as respectivas ações é o grande desafio. Aos olhos da sociedade, o MP é um só, todo ele custeado pelos contribuintes. Já é hora de serem repensadas certas atuações fragmentadas e isoladas na instituição, quando estão em jogo cenários voláteis e altamente impactantes aos interesses da nação brasileira.
O procurador-geral da República é o chefe do Ministério Público da União, mas, para além disso, preside o Conselho Nacional do Ministério Público e neste colegiado pode buscar um espaço de maior consenso e construção de diálogos institucionais. Outro campo propício para construções é o do Colégio Nacional de Procuradores Gerais do Ministério Público dos Estados e da União, onde se fazem presentes as lideranças nacionais de todos os ramos do Ministério Público brasileiro.
O certo é que, nestes megaprocessos, que atacam grandes estruturas corruptas e corruptoras, em que há entrelaçamentos e conexões profundas das provas, não há margem para atuações desprovidas de planejamento interinstitucional. A inteligência do sistema punitivo exige que as instituições fiscalizadoras comprovem racionalidade acusatória, segurança jurídica e coerção organizada em suas ações e investigações.
Além destas considerações, quanto à unidade do MP brasileiro, cabe acrescentar a necessidade de se observar também um diálogo crescente quanto à importância de qualificado intercâmbio de informações entre outras instituições externas, tais como CGU, tribunais de contas, autoridades administrativas independentes, polícias, entre outras. Deste modo, os órgãos encarregados da repressão aos ilícitos contra as administrações públicas, a ordem econômica, o mercado de capitais e o sistema financeiro nacional poderão articular de forma coordenada e inteligente as políticas públicas punitivas.
O cidadão, que paga seus impostos, não pode ficar à mercê de ilhas isoladas dentro de um Estado fragmentado por atuações institucionais permeadas por iniciativas de planejamento ineficazes, ou pautadas por vaidades ou, ainda, por outras finalidades que não aquelas que respeitem o interesse público primário.
Os princípios da impessoalidade, da eficiência e da legalidade administrativas devem nortear a atuação de todos os órgãos do Estado brasileiro no combate aos ilícitos praticados em detrimento do interesse da sociedade. A interdependência das instâncias remete a esse novo marco da inteligência punitiva como modelo para que as instituições ajam de modo cada vez mais coeso e integrado em busca da proteção dos valores superiores do ordenamento jurídico.
Fábio Medina Osório é presidente do Instituto Internacional de Estudos de Direito do Estado