Medina Osório, à Gazeta do Povo em 15/7: “Lei Anticorrupção e partidos políticos”

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Em artigo publicado na Gazeta do Povo em 19 de julho, o juiz Anderson Ricardo Fogaça sustentou que a “aplicação da Lei Anticorrupção aos partidos políticos contribuirá sobremaneira para a diminuição da corrupção e, como consequência, acarretará a retração dos gastos com as campanhas eleitorais”. De fato, a aplicação da Lei 12.846/13, popularmente conhecida como Lei Anticorrupção, gera grande impacto no sistema jurídico brasileiro, na medida em que suas consequências alcançam um espectro ainda indeterminado. Trata-se de uma lei que introduz deveres de probidade administrativa no mundo empresarial, que passa a absorver obrigações inerentes ao setor público.

A lei dispõe “sobre a responsabilização objetiva administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira”, aplicando-se “às sociedades empresariais e às sociedades simples, personificadas ou não, independentemente da forma de organização ou do modelo societário adotado, bem como a quaisquer fundações, associações de entidades ou pessoas, ou sociedades estrangeiras que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente”.

Na letra fria da lei, aparentemente os partidos políticos – que são pessoas jurídicas privadas – estariam em seu raio de incidência, à luz do artigo 44 do Código Civil. Todavia, entendo que os partidos políticos não devem ser compreendidos no alcance da Lei Anticorrupção. As finalidades institucionais dos partidos políticos relacionam-se ao processo eleitoral e ao princípio democrático, não podendo ser “dissolvidos” por ações baseadas nessa lei, tampouco sancionados nesses moldes.

A corrupção que atinge partidos políticos deve ser punida, mas não pela Lei Anticorrupção e sim pela legislação eleitoral. Imagine-se um partido político sendo submetido a multa de até 20% sobre o faturamento bruto anual, uma proposição surreal no caso dessas entidades, salvo no que diz respeito às infrações eleitorais propriamente ditas.

Portanto, não faz sentido uma abertura para dissolução de um partido político por ato de um de seus representantes (corrupção ou ato atentatório a princípios da administração pública). Há diversas infrações eleitorais tipificadas no Código Eleitoral (Lei 4.737/65), na Lei dos Partidos Políticos (Lei 9.096/95) e na Lei das Eleições (9.504/97). Dentre as infrações, estão aquelas descritas no Código Eleitoral, na medida em que os partidos colaborarem com a prática do ilícito ou se beneficiarem dela, as infrações referentes à propaganda eleitoral e as violações a normas legais ou estatutárias.

Em suma, é possível que os efeitos da Lei Anticorrupção sejam mesmo no sentido de coibir gastos com campanhas eleitorais, pois, se houver tentativa de lavagem de capitais, corrupção ou fraudes através de financiamentos espúrios de campanhas, a pessoa jurídica privada certamente enfrentará o impacto da Lei Anticorrupção. Porém, os partidos políticos contam com legislação específica no tratamento dessa matéria.

A toda evidência, não obstante o silêncio do legislador, a Lei Anticorrupção aplica-se a pessoas jurídicas de direito privado, sociedades simples ou empresariais, fundações e associações das quais seja possível e razoável exigir mecanismos de denúncia, auditoria e controladoria internos, sem que isso venha a ferir sigilos profissionais, menos ainda finalidades institucionais próprias de cada pessoa jurídica. Partidos políticos são veículos das democracias contemporâneas e suas impurezas podem ser tratadas pela boa aplicação dos mecanismos de controle do Direito Eleitoral, já consagrados.

Fabio Medina Osório, advogado, é presidente do Instituto Internacional de Estudos de Direito do Estado.
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