Se a empresa não prevenir ilícitos de seus funcionários, representantes ou dirigentes, sofrerá sanções severas, como multa de até 20% do faturamento bruto.
Na Constituição, improbidade é crime de responsabilidade do presidente, dos altos funcionários do Estado e de figuras que, além de enriquecimento ilícito e outras violações legais, praticarem atos como “inaptidão notória” e outros ilícitos culposos. Abusos e omissões já eram proibidos na Constituição de 1824. O Decreto 30, de 1892, apontava um rol de condutas ímprobas e a “desídia habitual no exercício das funções”. A Lei dos Crimes de Responsabilidade, de 1950, em vigor, prevê ações genéricas, incompatíveis com a honra, o decoro e a dignidade das funções, conceitos jurídicos indeterminados que podem significar dolo ou culpa.
A Lei 3.502, de 1958, já revogada, de autoria de Bilac Pinto, combateu o enriquecimento ilícito de agentes públicos, inspirada no Direito anglo-saxão. As únicas penalidades eram “perda dos bens havidos ilicitamente” e o “ressarcimento ao Erário”, sem maiores sanções.
A Lei 8.429, de 1992, inspirada na Lei Bilac Pinto, regulamentou o que já estava previsto na Constituição de 1988; punição da improbidade administrativa, independentemente da responsabilização cível, penal ou administrativa em sentido estrito (por ato do poder público), e ainda previu a indisponibilidade patrimonial dos infratores.
A Lei de Improbidade Administrativa alargou o espectro de sanções aos danos ao Erário por culpa grave ou erros grosseiros dos gestores públicos, com violação aos princípios de legalidade, impessoalidade, economicidade, eficiência, publicidade etc.
Por fim, a Lei Anticorrupção, de 2013, responsabiliza empresas privadas por atos de seus funcionários, representantes, dirigentes etc., a partir de dispositivos legais regidos pelo Direito Administrativo, abarcando condutas conceituadas como “corrupção” ou “improbidade empresarial”.
Na Lei Anticorrupção, as empresas devem adotar mecanismos que evitem ilícitos e controlem a ação de seus funcionários, porque responderão pela conduta deles. As ferramentas de proteção devem ser efetivas: não basta criar códigos de conduta, abrir supostos canais de denúncia ou nomear um compliance officer (controlador de lisura das operações) sem lhe dar autonomia e garantias. As empresas terão de comprovar a idoneidade e a adequação dos controles internos.
A Lei Anticorrupção e a Lei de Improbidade são repletas de normas sancionadoras “em branco”, que demandam interação com outras legislações, como a Lei de Licitações, a Lei de Lavagem de Capitais, a Lei dos Conflitos de Interesses, a Lei do Crime Organizado, a Lei Federal do Processo Administrativo e muitas outras.
Cada situação segue a legislação de regência. Por isso, a Lei de Improbidade incide diretamente sobre agentes públicos, enquanto a Lei Anticorrupção atinge empresas privadas. Mas, na prática, a Lei de Improbidade também alcança empresas contratantes com o Estado, e muitas delas enfrentam processos por improbidade administrativa, na condição de participantes, coautoras ou beneficiárias.
Essas duas leis podem ser invocadas numa mesma ação civil de improbidade, com sanções semelhantes, como interdições de atividades e proibições de contratos com administrações públicas. Mas a Lei Anticorrupção é mais severa, prevê medidas drásticas e penalidades mais contundentes. E há uma diferença de competências no diálogo entre elas: a Lei de Improbidade só é aplicada por magistrados, enquanto a Lei Anticorrupção também pode ser usada por autoridades administrativas.
A Lei Anticorrupção e a Lei de Improbidade incidem sobre responsabilidade empresarial por erros grosseiros ou culpa grave, envolvendo condutas praticadas e omissões. Mas, no caso específico de omissão das autoridades administrativas, sanções como multa e publicação da decisão devem ser postuladas em ação civil pública.
Pelas novas regras anticorrupção, se a empresa não prevenir ilícitos de seus funcionários, representantes ou dirigentes, sofrerá sanções severas, como multa de até 20% do faturamento bruto, interdição temporária de atividades, pagamento da divulgação da decisão condenatória e até mesmo a dissolução da pessoa jurídica, entre outras penalidades.
Os novos cenários regulatórios são altamente impactantes nos mercados, e ainda não assimilados pelos órgãos de controle. Discute-se agora a responsabilidade “objetiva” das empresas, mas, se implantarem mecanismos decompliance, prevenindo e evitando corrupção, não terão ligação alguma com quem praticar um ato isolado.
Por fim, o fato concreto é que a nova legislação já está sendo aplicada a ilícitos permanentes ou continuados que começaram antes mesmo de sua vigência. Por isso, gera a necessidade de extrema atenção das empresas.
Fábio Medina Osório é presidente do Instituto Internacional de Estudos de Direito do Estado