Construtoras, empresas de engenharia e incorporadoras foram responsáveis por mais da metade das doações a partidos políticos em 2012, segundo levantamento do G1 efetuado com base nas prestações de contas entregues pelas siglas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Os dados começaram a ser disponibilizados em maio deste ano – desde então, o G1 contabiliza manualmente os valores de cada doação.
Dos R$ 751,8 milhões recebidos em 2012 (ano de eleições municipais) por 27 partidos para financiamento das atividades partidárias e das campanhas, 55,3% (R$ 416 milhões) vieram de empresas do segmento de construção. O país tem 30 partidos registrados, mas três declararam não ter recebido nenhuma doação no ano passado (PRTB, PSOL e PCO).
O G1 considerou no levantamento as prestações de contas entregues ao TSE, que são dados oficiais do dinheiro arrecadado pelos partidos. Em anos anteriores, porém, houve casos de doações não contabilizadas, apelidadas de “caixa dois”. Foi o que aconteceu com o PT, por exemplo, no caso do mensalão, em que o próprio partido admitiu ter movimentado dinheiro de campanha sem declarar. O PSDB também é investigado por caixa dois no caso conhecido comomensalão mineiro. Um inquérito no Supremo apura arrecadação ilegal para a campanha ao governo de Minas Gerais em 1998, mas o partido nega irregularidades.
O financiamento de campanhas é um dos temas em discussão do grupo de trabalho da Câmara encarregado de elaborar uma proposta de reforma política e um dos principais pontos de divergência entre os deputados do grupo. Na última quarta (28), um grupo de quatro partidos protocolou na Câmara uma proposta de plebiscito sobre a reforma política, em que um dos temas sugeridos para consulta aos eleitores é o financiamento de campanha.
Atualmente, as campanhas são bancadas com dinheiro público – do fundo partidário – e com doações de pessoas físicas e empresas. Com o somatório das verbas, os candidatos e partidos, pagam as despesas de propaganda e bancam comícios e viagens, por exemplo. Alguns partidos e parlamentares defendem o financiamento exclusivamento público, sob o argumento de essa seria uma maneira de combater a corrupção.
Metodologia
O levantamento do G1 utilizou dados das prestações de contas do exercício de 2012, entregues no fim de abril deste ano, e das declarações de doações recebidas pelos diretórios nacionais especificamente para campanhas eleitorais, enviadas ao TSE no fim do ano passado (a prestação de contas da campanha foi feita à parte; o tribunal não obrigava que fosse incluída na prestação de contas do ano).
Dos 27 partidos que receberam doações, 11 declararam na prestação de contas do exercício também os valores recebidos para campanha (PMDB, PSDB, PSB, DEM, PSD, PC do B, PTB, PSC, PV, PT do B e PTC). O PEN, criado no ano passado, não participou da eleição e só declarou o exercício do ano, que é a verba recebida para financiamento das atividades do partido, como propaganda e realização de eventos, por exemplo.
Em relação aos outros 15 partidos que declararam separadamente os valores, o G1 somou as doações informadas nas duas declarações (a do ano e a da campanha). Foram os casos de PT, PP, PRB, PDT, PR, PPS, PMN, PPL, PHS, PSTU, PTN, PRP, PSL, PCB e PSDC.
Os dados sobre valores recebidos para as campanhas estão disponiveis no site do TSE em um sistema que permite exportar planilhas com as doações recebidas por cada legenda.
No caso da declaração do exercício de 2012, porém, os dados foram entregues em papel pelas legendas ao TSE, que digitalizou os documentos.
Por esse motivo, o G1 publica a reportagem somente agora – desde maio, contabiliza manualmente cada doação recebida.
O TSE está em fase de julgamento das contas apresentadas pelos partidos. Após a análise, poderá determinar suspensão de repasses de recursos do Fundo Partidário de legendas cujas contas sejam consideradas irregulares.
Construtoras
As informações das prestações de contas mostram que construtoras, incorporadoras, empresas de engenharia e empreendimentos imobiliários desembolsaram R$ 416,09 milhões para financiar partidos no ano passado.
A Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), que reúne as principais construtoras do país, afirmou ao G1 que defende a transparência e aprimoramento das regras do processo político.
“A CBIC preza pela transparência nas doações, na lisura de todo o processo, e também defende que as regras de todo processo politico devem ser aprimoradas para atender a estes princípios.”
Em segundo lugar em volume de doações a partidos estão agropecuárias, agroindústrias e empresas de fertilizantes, que destinaram R$ 61,36 milhões – 8,1% do total de recursos recebidos pelas legendas.
Em terceiro lugar na quantidade de recursos repassados a legendas aparecem bancos e empresas de investimentos, seguros e consórcios. Elas doaram R$ 51,28 milhões, 6,8% do total recebido por todos os partidos.
A Federação Brasileira de Bancos (Febraban), que reúne as instituições financeiras, disse que não iria comentar o assunto. “A Febraban não faz doações e não vamos nos manifestar sobre o tema.”
Quem mais recebeu
Considerando os dados declarados pelos partidos, o PT foi o que mais recebeu doações em 2012 – foram R$ 255,6 milhões.
Em segundo, terceiro e quarto lugares no ranking das doações, estão PMDB, PSDB ePSB, respectivamente. O PMDB declarou R$ 118,8 milhões; o PSDB, R$ 96,7 milhões; e o PSB, R$ 72,4 milhões.
O PP aparece em quinto lugar, com R$ 41,2 milhões.
Partido a receber mais doações no ano passado, o PT teve como fonte principal de recursos as campanhas. Para o exercício de 2012 a legenda declarou ter recebido R$ 35,8 milhões. Já o diretório nacional obteve R$ 219 milhões para as campanhas. A prática da “doação indireta” ou “doação oculta” é recorrente nas eleições. Em vez de repassar diretamente a um candidato, as empresas doam aos partidos, que distribuem a verba.
Em 2008, outro ano de eleições municipais, os quatro maiores partidos (PT, PSDB, DEM e PMDB) obtiveram juntos R$ 240,5 milhões, dos quais 57% somente de doações, segundo informou o jornal “Folha de S.Paulo” em maio de 2009. De acordo com a publicação, naquele ano construtoras e bancos lideravam as doações aos quatro partidos. Entre as quatro legendas, o PT foi a que mais arrecadou (R$ 61,1 milhões). O PSDB ficou em segundo (R$ 37,2 milhões); depois, DEM e PMDB.
Confira abaixo lista dos dez partidos que mais receberam doações no ano passado.
Partido |
Doações no exercício |
Doações para campanha |
Total declarado |
---|---|---|---|
PT |
35,8 milhões |
219,8 milhões |
255,6 milhões |
PMDB |
118,8 milhões |
(*) |
118,8 milhões |
PSDB |
96,7 milhões |
(*) |
96,7 milhões |
PSB |
72,46 milhões |
(*) |
72,4 milhões |
PP |
17,72 milhões |
23,5 milhões |
41,2 milhões |
DEM |
39,7 milhões |
(*) |
39,7 milhões |
PSD |
26,2 milhões |
(*) |
26,2 milhões |
PC do B |
19,79 milhões |
(*) |
19,79 milhões |
PRB |
6,7 milhões |
10,9 milhões |
17,7 milhões |
PDT |
não declarou |
14,1 milhões |
14,1 milhões |
(*) Declarou junto com o exercício de 2012 doações especificamente para as eleições de 2012 |
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Fonte: Tribunal Superior Eleitoral |
Ex-ministros do TSE opinam
Para o ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral Torquato Jardim as empresas doadoras acabam sendo beneficiadas pelos candidatos eleitos.
“O grande desafio é evitar a grande retribuição do favor do financiamento de campanha. São os favorecimentos nas licitações, todas as licitações, é o grande favorecimento nos empréstimos subsidiados do Banco do Brasil, da Caixa Econômica, do Banco do Nordeste. Aí é que está o grande retorno do investimento. Grandes empresas estatais do setor produtivo ou do setor financeiro comprando ações de empresas privadas para saldar dívidas da empresa para alavancar projetos de investimento da empresa privada. Esse é o grande desafio”, disse.
Para corrigir eventuais distorções e irregularidades em licitações, o ex-ministro do TSE Arnaldo Versiani defende proibir doações de empresas privadas e manter os repasses de pessoas físicas. Os dados mostram, porém, que os cidadãos comuns representam menos de 2% do que os partidos arrecadaram.
“Há sempre uma presunção de que esses candidatos, se eleitos, possam, no exercício de qualquer mandato, ter um maior vínculo com essas empreiteiras […] Então, eu acho que essa distorção poderia ser evitada, ou seja, acabar com o financiamento de pessoas jurídicas e manter o financiamento privado exclusivamente com recursos de pessoas físicas sujeitos a um determinado limite”, disse.