Responsabilidade objetiva não se aplica a ato da Justiça

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A responsabilidade objetiva do Estado não se aplica aos atos do Poder Judiciário, a não ser nos casos expressamente declarados em lei. Com este entendimento, assentado no Superior Tribunal de Justiça, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região manteve sentença que julgou improcedente pedido de indenização por danos morais manejado pelo advogado Glênio Diogo Vasques contra ato da juíza Marcele Cruz Lanot Antoniazzi, da 2ª Vara do Trabalho de Bagé.

 

O advogado se sentiu ofendido com os ofícios da juíza que pedem providência à OAB local e ao Ministério Público Federal sobre indícios de adulteração constatados em recibos de pagamento. Na lide, o advogado litigava contra sua empregada doméstica, que foi demitida sem receber as parcelas rescisórias.

 

Para o juiz federal Fernando Tonding Etges, que proferiu a sentença de improcedência da reparação moral, a medida da magistrada trabalhista partiu dos indicativos que constituíam crime. “Em virtude da previsão legal (…), seria contraditório ela transcrever na sentença que acreditava haver falsificação e não tomar as providências cabíveis, pois estaria esquivando-se de responsabilidade legal a ela imputada”, justificou.

 

O relator da Apelação, desembargador federal Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle, afirmou que o ato da juíza não teve má-fé, nem intuito deliberado de prejudicar o advogado, uma vez que fundamentou seu convencimento com base nos elementos trazidos à lide trabalhista. Além disso, o artigo 40 do Código de Processo Penal (CPP) determina aos juízes que, verificada a existência de crime de ação pública, deve o Ministério Público ser noticiado a respeito.

 

Para Aurvalle, a remessa dos ofícios antes do trânsito em julgado não ofende o contraditório ou direito à ampla defesa, porque o fato supostamente criminoso não deve ser equacionado no processo trabalhista. Tal providência, destacou, está inserida no âmbito dos poderes correicionais do juiz, razão pela qual não está sujeita a requerimento das partes nem a recurso contra eventual deferimento ou indeferimento quando pleiteada no curso do processo.

 

“Acerca do suposto dano moral, não se configura pelo fato de responder a inquérito, de per si, ainda mais quando o inquérito está em aberto; caso contrário, qualquer pessoa que estivesse incluída em investigação teria direito de ação contra o Estado, antes mesmo de ser elucidada sua responsabilidade”, fulminou o desembargador-relator. O acórdão foi proferido à unanimidade na sessão de julgamento do dia 22 de janeiro.

 

A demanda trabalhista


A autora afirmou em juízo que trabalhou para o advogado no período compreendido entre 3 de janeiro e 30 de março de 2009, como empregada doméstica. Como foi dispensada sem justa causa e não recebeu as parcelas rescisórias, entrou com reclamatória trabalhista para fazer valer os seus direitos. Pediu, também, retificação da data de admissão e de dispensa em sua Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS).

 

Notificado pela 2ª Vara do Trabalho de Bagé, o advogado apresentou defesa. Alegou que a reclamante foi contratada por prazo determinado, tendo firmado contrato de experiência com início em 2 de fevereiro e término em 31 de março de 2009. Findo o contrato, comunicou-lhe que não seria admitida, já que não havia atendido às exigências do serviço doméstico nem gostava de receber ordens. Assim, considerando a natureza do contrato de experiência, entendeu que nada era devido à ex-empregada.

 

A juíza do trabalho Marcele Cruz Lanot Antoniazzi observou que, no Direito do Trabalho, a manutenção de contratos por prazo determinado é exceção. “A regra é o contrato por prazo indeterminado, e a invalidade dos contratos por prazo determinado implica a sua consideração como na modalidade de prazo indeterminado”, complementou.

 

A juíza afirmou que o reclamado registrou o contrato de experiência por 60 dias na área destinada a “Anotações Gerais” da CTPS, a partir do dia 19 de janeiro. Este registro contraria o que está escrito no recibo juntado pelo próprio reclamado no processo. Conforme a decisão, o reclamado tentou “fazer crer” que a reclamante havia sido admitida no dia 2 de fevereiro. Mas havia outras “incongruências” dignas de registro, de acordo com a juíza.

 

“Surpreende o Juízo que o documento nº 01 da fl. 25, firmado, em princípio, no dia 02.02.2009, contém escrito que a autora estaria dispensando o vale-transporte no dia 18.02.2009, incoerência que nem se admite como verossímil. E nem se acredita que tal documento reproduza a verdade dos fatos, pois se fosse digno de crédito, atentando-se também ao item 3 da fl. 20 da defesa, de forma absurda levaria à conclusão de que no primeiro dia de trabalho como doméstica (fevereiro de 2009, segundo a contestação) a autora já teria recebido R$ 415,00 sem prestar nenhum trabalho, o que nem é crível”, anotou a sentença.

 

Por fim, a juíza observou que a anotação “prorrogado contrato de experiência até 31/03/2009”, que consta num dos recibos, foi feita após a confecção do documento, com caneta diferente. Aliás, diversos tipos de canetas foram usados para acrescer observações noutros recibos – ou seja, lançando dados estranhos no documento original.

 

Neste contexto, ficou afastada a tesa da defesa e evidenciada a má-fé do advogado. “E isso porque está nítido, a partir da prova documental, que o reclamado tentou, por todas as formas, se furtar do pagamento das parcelas trabalhistas devidas à autora, tentando artificiosamente adulterar documento assinado pela autora, não sendo concebível tal ato como proveniente de um advogado, que tem consciência de seus atos.”

 

A evidência na alteração de documento particular, “e de forma grosseira”, fez a juíza encaminhar ofícios, com a cópia da decisão judicial, ao Ministério Público Federal e à secional da OAB em Bagé, para as providências cabíveis.


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