A defasagem regulatória do setor de Telecomunicações

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É inquestionável que as telecomunicações brasileiras tiveram um grande impulso a partir do final dos anos 90. Parte do sucesso alcançado deve-se ao “modelo” utilizado, baseado na competição plena no provimento dos serviços com base nas leis de mercado; na privatização das empresas oriundas do modelo estatal; no acesso universal aos serviços básicos; e na criação de um órgão regulador com atribuições para administrar e coordenar a prestação dos serviços.

O modelo foi consolidado pela Lei N.º 4.972 (LGT), de 16 de julho de 1997, e estruturado técnica e administrativamente com a regulamentação editada pela Anatel. Aspectos importantes foram regulados, entre os quais podem ser citados: os direitos dos usuários, no que concerne à quantidade, diversidade, cobertura e qualidade dos serviços, bem como a razoabilidade dos preços praticados; a continuidade dos serviços prestados em regime público; regras para incrementar a concorrência na exploração dos serviços; a interoperabilidade das redes; e o gerenciamento dos interesses da União no setor.

 

Contudo, algumas deficiências ficaram evidentes com o passar do tempo, como é o caso, por exemplo, da insuficiente universalização dos serviços em áreas rurais, remotas e de menor desenvolvimento econômico e social; do incipiente desenvolvimento de tecnologias brasileiras; da involução na criação de uma indústria nacional de telecomunicações robusta; dos desvios na formação de mão de obra especializada para o planejamento, projeto e operação das redes; e da inexistência de um programa de governo para a evolução estruturada, a médio e longo prazo, do setor.

Um aspecto positivo pouco reconhecido do modelo foi a sua aderência aos fundamentos da viabilização econômica da prestação dos serviços. Isso permitiu atrair investimentos da iniciativa privada para o setor sem os quais não teria sido possível chegar aos significativos resultados do período considerado, alcançados a partir de elevados investimentos, da ordem de R$ 240 bilhões.

Entretanto, uma nova realidade se apresenta. O Estado, as empresas e os cidadãos dependem, cada vez mais, dos
serviços de telecomunicações. Uma variada gama de aplicativos surge continuamente nas mais diversificadas formas tecnológicas. E players oriundos de outras áreas passaram a atuar no setor. Tais fatores, entre outros, promovem um ambiente para o qual é necessário evoluir em termos da legislação e da regulamentação, evidenciando a conveniência de se repensar o modelo atual à luz do cenário que delineia o futuro das telecomunicações – em muitos aspectos já presente – e de adaptá-lo para fazer face às novas exigências com que se defronta o setor. Isso, certamente, repercutirá no arcabouço legal e regulatório vigente, fortalecendo as teses que defendem a necessidade de uma pronta revisão da LGT.

Dois pontos merecem destaque nas ações a serem desenvolvidas: propiciar condições para incentivar a iniciativa privada a continuar investindo fortemente no setor e criar instrumentos para resolver a questão do acesso universal aos serviços. O primeiro envolve cifras gigantescas, pois não é difícil concluir que nos próximos dez anos será
necessário investir recursos da mesma ordem do período passado.

O segundo ponto envolve a viabilização técnica e econômica de um dos pressupostos do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), que atribui a todo o cidadão, independentemente de sua classe social, condição financeira ou localização geográfica, o direito a um acesso de banda larga, ajustado às suas necessidades e às suas possibilidades, em um prazo razoável. Isso também se aplica a cada família, a cada grupo social, a cada empresa ou a qualquer entidade representativa.

Nesse sentido, faz-se necessário formular uma agenda que, entre outros aspectos, leve em conta políticas e ações visando: rediscutir a figura da reversibilidade de bens como instrumento garantidor da continuidade da prestação dos serviços; viabilizar a prestação de serviço em regime público vinculado à oferta da banda larga e/ou criar meios que permitam a oferta do acesso universal no regime privado; analisar o papel e a forma como as atuais concessionárias se colocarão no novo contexto regulatório; equacionar os conflitos no processo de competição entre serviços prestados no regime público e no regime privado; e promover o acesso às redes das prestadoras detentoras de poder de mercado significativo, no contexto do interesse social das mesmas, sem perda de atratividade para os investimentos dessas empresas no setor.

Em um âmbito mais geral, o governo deve inovar no processo de planejamento estratégico fixando diretrizes, objetivos e metas balizadores das atividades dos agentes privados responsáveis pela execução; atuar para reduzir a carga tributária que incide sobre os serviços de telecomunicações no País; e buscar o aumento da participação da indústria brasileira de bens e serviços.

Trata-se de uma agenda intensa e politicamente sensível. No entanto, é necessário enfrentá-la para que o País dê um salto para atingir patamares idênticos aos que as nações mais desenvolvidas estarão alcançando nos próximos anos. Caso haja vacilo, é certo que a “brecha digital” aumentará provocando defasagens indesejáveis para a sociedade brasileira nos seus mais variados segmentos.

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